A História do Cóccix

Leo Ivan
6 min readApr 11, 2021

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Essa história está entre as que eu sempre conto mas sempre de forma imprecisa e resumida, afinal, nem mesmo eu lembro dos detalhes. Hoje, dia 11 de Abril de 2021 eu recebi uma notificação de lembrança do Facebook sobre um greentext que fiz sobre essa história em 2016 pra minha ex-namorada. Essa é a história do dia que eu quebrei o cóccix, palavra essa que só aprendi a escrever depois de quebrar o meu.

Essa história será 100% adaptada do greentext que escrevi em 2016, nele há algumas coisas que não escreveria hoje em dia então não irei vincular ele aqui.

Tudo começa no final de 2015, era um momento em que eu estava muito ativo como skatista e meu ciclo social do dia-a-dia eram meus amigos de skate. Nessa história teremos o Adriano, Gabriel, Higor e Eduardo. No fim daquele ano queríamos marcar um role de skate épico para começar 2016, inicialmente iríamos dia 10/01 sair pra andar de skate e dormir todos na casa do pai de um amigo, só voltaríamos dia 13/01.

Dia 10 estava me preparando, era 18h50 e nos encontraríamos 19h, aviso em nosso grupo que estava indo ao ponto de encontro porém o encontro foi adiado para o dia seguinte às 7h. Quando deu 1h, senti que eu não conseguiria acordar cedo o bastante pra me encontrar com eles então decidi virar a noite — e ir sem descanso ter um dia de atividade física, uma belíssima ideia. Perto das 4h eu acabo caindo no sono, como qualquer pessoa sensata poderia prever, e só acordo às 7h38 com a minha campainha sendo tocada freneticamente pelos meus amigos putos comigo. Rapidamente me troco e vou com eles, de carro, até o Shopping-Metrô Tucuruvi.

Tucuruvi, 8h, estávamos todos famintos mas também precisávamos comprar as passagens de metrô então resolvemos nos dividir, eu, Gabriel e Higor iríamos procurar um Ragazzo pra comprar coxinhas enquanto o Adriano e o Eduardo comprariam as passagens.

Só pra contextualizar sobre os personagens, Eduardo e Adriano eram os mais responsáveis e sensatos, eu, Gabriel e Higor éramos totalmente desmiolados.

Em nossa busca, não encontramos escadas pra subir pro terceiro andar (onde ficava a coxinha) e resolvemos ir de elevador. Surpresa: o botão do terceiro andar não está funcionando. Trocamos de elevador e deu na mesma, botão do terceiro andar sem funcionar. Eis que temos a brilhante ideia: ir até o quarto andar, que era o estacionamento, e descer de escadas.

Estacionamento é aquela coisa, cimento queimado e liso como porcelanato, uma delícia para andar de skate, porém, sempre proibido de andar. Ao chegar lá, subimos em nossos skates e andamos com cautela por medo de algum segurança vir advertir a gente. Achamos um hall iluminado no meio do estacionamento e fomos até lá para ver se achávamos as escadas.

Ao chegar no hall, havia uma escada rolante para o terceiro andar, porém, ela estava ligada para subir e como estávamos naquela busca faz tempo, decidimos descer a escada que sobe correndo mesmo e safoda. Amarrei meu cadarço apertado, me preparo e… Uma segurança aparece do absoluto além.

— Moça, a gente consegue acessar o terceiro andar? Queríamos comprar algo pra comer — literalmente qualquer um de nós disse isso

— Não tem nada aberto lá, só a partir das 10h

Resolvemos descer e ir avisar nossos amigos que estavam na fila do metrô aguardando nosso heroico retorno com os lanches.

— Moça, a gente pode ir até ali do outro lado de skate? — perguntei de forma despretensiosa já esperando pelo não

— Ah, pode

Estávamos muito empolgados com o fato de andar num estacionamento sem o risco de alguém vir nos xingas e remamos a todo vapor quase que com a intenção de decolar.

Não é de conhecimento geral mas irei explicar um evento skatístico: ao se atingir certa velocidade em cima do skate, ele perde estabilidade. Mesmo andando em linha reta ele começa a tremer e você é arremessado pra fora dele por inércia.

Foi o que ocorreu comigo, peguei muita velocidade e precisava desviar de um cone, o skate começou a tremer e eu fui arremessado pra frente. Caí sentadinho, de bunda e fico ali mesmo, sentado no chão sofrendo. Meus amigos que também estavam rápidos tomam distância e ao perceber que eu estava caído atrás começam a gritar “levanta logo, para de enrolar e vambora”. Levantei lentamente e sigo o rumo com fortes dores traseiras.

Encontramos nossos amigos na entrada do metrô mas havia começado a chover, não conseguiríamos ter nosso dia pelas ruas com a chuva e mesmo após a chuva ainda estaria tudo molhado. Encontramos no Google uma pista coberta não muito longe dali que poderia salvar nosso dia e fomos andando. Chegamos lá por volta das 10h mas estava fechada, contudo, conseguíamos ouvir barulhos vindo de dentro da pista e resolvo bater no portão para ver se alguém estava lá. Descobrimos que estava sendo reformada e só abriria para andar às 14h, melhor que nada.

Com a fome acumulada e o tempo de espera, resolvemos almoçar 10h mesmo, qualquer coisa a gente almoçava depois de novo. Foi um desafio achar lugares que vendiam marmita essa hora mas achamos, no caminho também comprei alguns analgésicos devido meu sofrimento anal intenso. Almoçamos ali na porta da pista mesmo e ficamos escorados no canto pra nos proteger da chuva enquanto esperávamos.

Por volta das 13h o homem da pista abre a porta e nos chama pra esperar lá dentro por conta da chuva, 13h30 ele deixa a gente andar. Era 15 reais por cabeça pra andar, 2 amigos meus não tinham levado nada, Higor e Gabriel, os desmiolados. Estava com uma nota de 50 e paguei nossas 3 entradas, menos 45 reais de alguém com 50 reais de capital acumulado.

Eu literalmente não conseguia fazer nada por conta de injúria anal então acabei ficando de cinegrafista, horas de viagem e 45 reais para ficar sentado gravando os outros e segurando gelo na bunda pra aliviar.

Ligação surpresa durante a tarde: o pai do nosso amigo não viria mais buscar a gente e não dormiríamos mais na casa dele. Estávamos sem dinheiro pra voltar, como estávamos preparados pra voltar com ele, gastamos tudo em comida e na pista.

17h30 resolvemos ir andando, iríamos pra casa da vó do Adriano e de lá o pai dele levaria cada um pra casa. Andamos. Andamos muito.

19h ainda andando, estávamos passando em frente ao Campo de Marte, uma região que naquele horário era ponto de prostituição. O Gabriel, que na época tinha o cabelo grande, é convidado por uma das garotas de programa para um encontro, não com essas palavras. “Tô suave” respondeu ele.

21h e ainda estávamos andando, até hoje nunca andei tanto em minha vida. Toda essa caminhada sendo feita com insuportáveis dores no cóccix. Todos mortos de fome, a última refeição de cada um antes daquela maratona foi o almoço às 11h da manhã. Paramos num Extra e compramos umas bolachas de marcas genéricas com uns trocados que juntamos. Aquelas gorduras sabor chocolate nunca foram tão disputadas e apreciadas na história das bolachas genéricas.

Andando e andando. Mais uma bela ligação surpresa do pai do Adriano:

— Não vai dar pra ir pra casa da sua vó, para em algum bar por aí que vou passar pra te dar um dinheiro pra pegarem um táxi.

A casa da vó do nosso amigo, que estávamos indo fazia 5 horas, era sentido contrário a nossa, em todo esse tempo andando só nos afastamos de nossas casas e se, por acaso, tivéssemos gastado esse tempo andando sentido nossas casas já estaríamos lá.

Ligação da mãe do Higor:

— Você disse que ia pra casa do seu amigo e está a essa hora no meio da rua? Da tchau pra eles e vem pra casa

Ele ignorou as ordens.

Ligação da mãe do Adriano: sermão.

Alguns momentos depois a mãe do Adriano ligou e avisou que pediu pro pai dele não ir até lá, deveríamos pegar um taxi até a casa dele que ela daria 60 reais.

Voltamos a andar. Da pista até o ponto em que estávamos já havíamos andado mais de 20km, 5 horas andando e eu mancando com dor no cóccix.

Avistamos um táxi e explicamos pra ele a situação. Ele fica espantado com o caos que estávamos e aceita nos levar até a casa do Adriano pelos 60 reais. Fomos o caminho todo papeando sobre nosso dia. Ao final da corrida, o valor era de 66 reais mas pagamos 60 pelo combinado.

A situação era: quase meia noite, chovendo, estávamos na casa do Adriano. Gabriel e Higor moravam no mesmo prédio do Adriano. Eduardo morava na São Rafael, próximo dali e eu morava a uns 3km dali ainda e estava de cu doendo. Resolvi dormir na casa do Eduardo.

Chego lá por volta das 00h30, tomo um banho e a dor no cóccix prevalece. Ficamos acordados até 5h conversando sobre a vida e outros assuntos filosóficos que tomam tempo.

12/01/16: acordo e fico por lá porque eu estava sem a chave de casa, minha mãe vai me buscar e após análise descubro que toda aquela dor que senti o dia inteiro era porque meu cóccix estava quebrado. Eu quebrei o cu.

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Leo Ivan
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Errante e exótico. Aqui é onde eu materializo algumas histórias que vivo ou lembro pq acho um processo legal e minha memória é ruim. https://medium.com/@leoivan